Doadores de Lula e Mercadante serão investigados pela polícia, que procura origem do dinheiro para dossiê contra tucanos

A Polícia Federal investigará a movimentação financeira de doadores de campanha do PT atrás de pistas sobre a origem do dinheiro que seria usado por petistas para a compra do dossiê contra os tucanos. Os policiais querem identificar se, em nome dos financiadores de candidatos da legenda, existem transações atípicas de onde possam ter saído os recursos — ou parte deles — para bancar o material que comprometesse integrantes do PSDB com a máfia dos sanguessugas.

A nova frente de apuração se concentrará nos doadores de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do senador Aloizio Mercadante, candidato derrotado ao governo de São Paulo. Até agora, os envolvidos com a negociação do dossiê eram ligados ao comitê de um e do outro. Trabalhavam para Lula Jorge Lorenzetti, encarregado de coordenar o núcleo de análise de risco e mídia do comitê; Osvaldo Bargas, ex-secretário-executivo do Ministério do Trabalho e que ajudou a escrever o programa de governo do presidente reeleito; e Expedito Veloso, também envolvido na campanha.

No caso de Aloizio Mercadante, quem se envolveu no episódio foi Hamilton Lacerda, seu ex-coordenador de comunicação. A polícia apontou Lacerda como o “homem da mala”, suspeito de ter entregue a Valdebran Padilha e Gedimar Passos o dinheiro que seria repassado ao empresário Luiz Antônio Vedoin em troca do dossiê. Os dois foram flagrados pela PF em um hotel da capital paulista, no dia 15 de setembro, com cerca de R$ 1,75 milhão (R$ 1,1 milhão e US$ 248,8 mil).

A PF terá acesso, a partir de hoje, à lista de doadores de campanhas petistas. É que venceu ontem o prazo para que os candidatos que concorreram apenas no primeiro turno, caso do senador Aloizio Mercadante, apresentassem aos tribunais regionais eleitorais nos estados a prestação de contas, com a indicação de contribuintes e respectivos valores. Os dados são públicos. O comitê do presidente Lula terá até o dia 29 para entregar à Justiça Eleitoral o balanço entre receitas e despesas.

Saques

Os policiais encarregados de tentar desvendar a origem desses recursos confrontarão a lista dos doadores de Lula e de Mercadante com os nomes das pessoas que, às vésperas da apreensão do dinheiro na capital paulista, fizeram saques nos bancos Bradesco, BankBoston e Safra. Os investigadores sabem que parte dos valores em reais que estavam com Valdebran e Gedimar saíram dessas três instituições, mas eles ainda não conseguiram identificar os sacadores porque não há no sistema bancário brasileiro um controle das retiradas monetárias a partir da numeração das cédulas.

O cruzamento de dados, de acordo com um dos investigadores escalados para cuidar do caso, pode revelar possíveis movimentações atípicas em nome de doadores de campanha do PT — tanto realizadas por pessoas físicas como jurídicas. Ele explicou ainda que a idéia é tentar revelar se houve, além de doações registradas pelo PT, contribuições por meio de caixa 2 que, depois, foram parar nas mãos do grupo petista que negociava com o sócio da empresa Planam o dossiê antitucano.

Com informações repassadas pelo Banco Central, a PF montou um arquivo de dados com mais de 43,7 mil contas bancárias. Nos trinta dias que anteriores a 15 de setembro, elas registraram cerca de 1,58 milhão de transações financeiras. Por enquanto, dos R$ 1,1 milhão apreendidos com a dupla petista, a polícia conseguiu avançar apenas no que se refere a uma pequena parcela: R$ 5 mil, que teriam transitado por bancas do jogo do bicho na Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro, atribuídas a Antônio Petrus Kalil, o Turcão. No pacote dos reais foram encontradas duas tiras de papel com algumas anotações que, segundo os policiais, são semelhantes às utilizadas pelo jogo do bicho.  

Senador se diz “à disposição”

O senador Aloizio Mercadante (PT-SP) informou ontem, por meio de sua assessoria, que colocou à disposição da Justiça todos os dados que as autoridades encarregadas de investigar o escândalo julgarem necessárias para esclarecer o caso, incluindo informações de sua prestação de contas eleitoral. O petista salientou ainda que não tinha conhecimento da negociação do dossiê contra tucanos, que não autorizou ninguém de sua equipe de campanha a negociar o tal material em seu nome e que deixou claro a todos os seus assessores que não admitiria essa estratégia em seu comitê.

Logo após a revelação de que Hamilton Lacerda estaria envolvido na compra do material contra tucanos, Mercadante o afastou da campanha, onde ocupava o cargo de coordenador de comunicação. “A questão básica é a seguinte: qualquer que tenha sido o nível de participação, sem a minha autorização, sem o meu conhecimento, sabendo que eu sou contra, era contra e serei contra, é uma quebra de confiança que eu não posso aceitar”, declarou o senador à época.

A coordenação de campanha do presidente Lula não foi localizada ontem à noite pela reportagem do Correio Braziliense para tratar do assunto. Em 19 do mês passado, em meio à corrida rumo ao segundo turno das eleições, o coordenador de campanha do PT à reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Marco Aurélio Garcia, afirmou que o partido encaminhou um fax à Justiça Federal em Mato Grosso, onde tramita o inquérito da Polícia Federal que apura o escândalo, oferecendo o sigilo bancário do partido. Com a decisão, justificou ele, o PT pretendia “facilitar o trabalho da Justiça, acabar com as especulações e possibilitar a maior transparência nas investigações”.

Marcelo Rocha

Correio Braziliense