Há cerca de 20 anos, a “Revista de Informação Legislativa” publicou trabalho muito interessante, de autoria de Gerald E. Caiden, PhD e professor titular da Escola de Administração Pública da Universidade do Sul da Califórnia-EUA, e Daisy de Asper y Valdés, PhD, assessora do Senado Federal e Procuradora da República aposentada dos EUA. O título da obra é “A essência do profissionalismo no serviço público”.

Para descrever a essência pregada no título, o artigo analisou os valores do profissionalismo em paralelo a algumas atribuições relativas às atividades práticas para a prestação de um serviço público eficiente, moderno e capacitado.

Desde que institucionalizado, nos primórdios da civilização, o governo reconheceu a necessidade de servidores públicos de carreira para movimentar sua máquina e assegurar a implementação e realização das políticas públicas. Por séculos, senão milhares de anos, têm-se reconhecido o serviço público adequado como o elo entre governantes e governados.

É sempre bom dizer que o bom governo não é um luxo, mas uma necessidade vital, sem a qual não há desenvolvimento econômico e social. Mas algumas vezes, em condição desordenada de fluxo e transição, a visão mais ampla do governo é distorcida por exclusivos interesses pessoais. E no rumor das vozes competitivas, e sob efeito do manto das paixões enganadoras, alguns demagogos elevam mais os seus clamores. Outros, de igual relevância, não são ouvidos, talvez por modéstia ou culpas passadas. Injustamente, são esquecidos.

Nesse jogo, arbitrado em prol de interesses pessoais, o servidor fica confuso. É enganado por falta oratória, emoção temporária, ou mesmo por tendências masoquistas, que bem arquitetadas só tendem a favorecer um determinado grupo em lugar de outros.

Restaurar o equilíbrio entre as partes, o que seria justo, não é tarefa fácil, pois as gralhas de vozes estridentes que habitam nos mais altos galhos das araucárias não permitem que outras vozes sejam proclamadas. A não ser que, entre alguns galhos dessas coníferas, encontremos mecanismos de autocorreção que desde que bem aplicadas possam reduzir as bitolas arcaicas e as desigualdades salariais que permeiam entre determinados grupos de servidores que labutam na esfera da administração pública.

Exemplo de desgovernança é a nota discriminatória publicada pela Divisão de Comunicação Social da Polícia Federal em julho de 2016: “Dessa forma, a Direção-Geral reitera sua disposição em garantir a recomposição dos salários de todos os policiais valorizando àqueles que são a essência da Polícia Federal”. Nunca é demais lembrar que o referido aumento passou longe da carreira administrativa. Nossa categoria foi uma vez alijada das negociações porque, ao que parece, a Direção-Geral da Polícia Federal não nos enxerga como essenciais.

“Mudam-se os tempos, mudam as vontades” ditava o bardo português quinhentista Luís de Camões. Com isso mudam-se os costumes, quer concordemos ou não.

Faz-se necessário mudar as vontades, os costumes, o tratamento desigual que, combinado com diferenças salariais escorchantes, veem contribuindo a longínquos anos com o abismo vulcânico existente entre servidores da carreira administrativa e da carreira policial. Essa disparidade alimenta frustações e decepções que culminam nos inúmeros pedidos de exonerações de servidores administrativos, que migram para outros órgãos públicos à procura de melhor horizonte. Esse quadro só pode mudar quando empreendimentos de iniciativa da própria Direção-Geral estabelecer prioridades e conjunto de valores que atendam verdadeiramente os anseios da categoria, estimulando o desempenho desses profissionais.

A Direção-Geral da Polícia Federal tem que se dar conta de que deve haver mudança de rumo. Visão limitada é luxo do passado. Precisamos já de uma visão compartilhada e ampla de futuro! A história tem demonstrado o que funciona e o que não funciona. O que resulta melhor ou não resulta absolutamente nada. Ideologias e crenças ultrapassadas têm que ser revistas. Nenhuma instituição ou conjunto de instituição se ajusta a todos quando seus arranjos sociais apenas acomodam uns e outros não.

É bom ressaltar ainda que, acima de tudo, um futuro diverso requer novas medidas, habilidades, valores e objetivos. É sempre bom dizer que, o ser humano tem necessidade intrínseca de sentir-se valorizado e reconhecido. A cultura da valorização e do reconhecimento no ambiente de trabalho nunca foi tão importante e tão intensificada. E uma vez que os servidores da carreira administrativa da PF desempenham conjunto de atribuições impares no setor público, é justo que a categoria seja corretamente valorizada.

Para encerrar, invoco mais uma vez a “Essência do Profissionalismo no Serviço Público”:

“Espera-se que todo servidor público profissional tome liderança ao executar seus deveres cívicos e que se apresente como voluntário quando instado para ajudar aos necessitados”. Mesmo entregue ao abandono e à própria sorte por parte de seu órgão, sem sequer portar uniforme ou qualquer distintivo que os distingam como servidores da PF, dia após dia assistimos a voluntariosos colegas cumprirem suas honrosas missões, sem desistir.

“É difícil justificar, em administração pública, o tratamento privilegiado a certos indivíduos, que não se estenda a todos os outros em igual circunstâncias

Iran Ferreira de Miranda
Agente Administrativo da Polícia Federal