Falta de entendimento entre governo e oposição torna improvável votação da medida provisória dos aposentados

  Os próximos três dias de trabalho dos deputados correm sério risco de terminar como os últimos três na Câmara: sem qualquer votação em plenário. O presidente da Casa, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), sabe disso, e a partir de hoje fará uma tentativa, prevista como infrutífera, de conseguir acordo entre os líderes do governo e da oposição para votar a Medida Provisória 291, na qual se discute o tamanho do reajuste anual das aposentadorias e pensões maiores que um salário mínimo. As chances de um acerto são remotas.

Sem a votação da MP, nada pode ser apreciado na Câmara, como ocorreu na semana passada. Aldo vai ouvir, em encontros individuais, os líderes dos partidos que estiverem em Brasília. O líder interino do governo na Câmara, Beto Albuquerque (PSB-RS), deve conversar com ele no final da manhã de hoje. “Não podemos passar os dias 1º, dois e três de agosto sem votar nada, é inaceitável, é imperdoável”, antecipa-se Albuquerque.

Mesmo que não votem nada, todos receberão o salário integral de R$ 12.870, ou R$ 4.282 por dia trabalhado. A situação “inaceitável” para o líder, porém, está prestes a ocorrer. Há quem veja na atitude de Aldo uma simples tentativa de mostrar que não é responsável pela paralisia da Casa. A Câmara não vota um projeto há quatro meses devido à disputa política acirrada com a aproximação das eleições, embora tenha havido número suficiente de parlamentares em Brasília nas últimas semanas.

A presidência da Câmara divulgou ontem que na semana passada compareceram 427 deputados na terça e 423 na quarta, um quorum elevado. Mesmo assim, nada foi votado. Há na pauta da Câmara projetos considerados prioritários como a Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas e a proposta de Timemania, que cria uma loteria para arrecadar recursos para pagar as dívidas dos clubes de futebol com o governo federal.

Os parlamentares também entraram em férias informais mesmo sem ter votado a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Antes de entrar em recesso branco, o Senado ainda fez um pacote de votações, que incluiu o projeto mais importante para o governo no Congresso este ano: o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb).

Disputa eleitoral

A pauta da Câmara, porém, está parada por um impasse, que Aldo tentará a partir de hoje ultrapassar, provocado pela disputa eleitoral. Os governistas não querem aprovar a MP como o governo enviou, com reajuste de 5% para os aposentados, já que a oposição insiste na votação de um aumento de 16,6%. Temem ser acusados, em plena campanha eleitoral, de defender um reajuste menor. O governo também não quer partir para uma votação com a perspectiva clara de sofrer uma derrota que causará um rombo de mais de R$ 7 bilhões nos cofres da Previdência. Se isso ocorrer, em vez dos parlamentares, será o presidente Luiz Inácio Lula da Silva que terá de pagar o preço do desgaste de vetar pela segunda vez o reajuste. O porcentual já foi aprovado na MP que reajustou o salário mínimo. Por isso, tanto os parlamentares aliados quanto o próprio governo preferem fugir da votação.

Os aliados trabalham com a hipótese clara de aguardar até o dia 10 de agosto, quando a MP perde a validade. Os aposentados teriam garantidos apenas 3,18% de reajuste (o equivalente à inflação acumulada em um ano). Parlamentares dizem que o Ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, já estuda alternativas para a concessão de um aumento real. Uma das hipóteses é a concessão de um abono de 5%. A outra, a edição de nova MP com um reajuste levemente diferente: de 4,9% ou 5,1%, pois a lei proíbe reedições de medidas provisórias. Essa solução, porém, é considerada de risco pois, como trata-se do mesmo assunto, poderia ser questionada.

As possibilidades estão sendo levantadas pela área econômica porque o governo também não conseguiu acordo com a oposição. A idéia era fazer uma votação simbólica, sem a identificação dos deputados. Os oposicionistas não aceitam a proposta. Querem carimbar no governo o estigma de insensibilidade com os aposentados. “É um absurdo. Eles não querem que o parlamento legisle efetivamente, não exponha o que pensa”, rebate o líder do PFL na Câmara, Rodrigo Maia (RJ), que põe a responsabilidade sobre ombros governistas: “Quando eu era da base aliada no governo Fernando Henrique votei muitas propostas que geravam desgaste em ano eleitoral. A base atual não quer assumir que é governo.”

Helayne Boaventura

Correio Braziliense

18/7/2006