Volume médio adquirido pelas classes D e E subiu 11%, contra média nacional de 5%, segundo estudo em 8.200 domicílios

Aumentaram também as compras de produtos práticos, como suco pronto e massa instantânea, entre a população de baixa renda

Aumentou 5% o volume de produtos comprados pelos brasileiros na era Lula, de 2003 até agosto de 2006. Dessa cesta um pouco mais gorda, fazem parte os itens alimentícios, de limpeza e higiene e beleza. No mesmo período, os gastos (nominais) para compras dessas mercadorias cresceram 31%. Foram os mais pobres que compraram mais: há quatro anos, a lista de supermercado das classes D e E era composta por 21 categorias (como farinha, leite, sabão em pedra etc). Em 2006, o número de categorias subiu para 27 (alta de 29%).

Os dados fazem parte da pesquisa “O Consumidor na Era Lula”, apresentada ontem, em São Paulo, pela consultoria LatinPanel. Foram visitados 8.200 domicílios semanalmente nos últimos anos no país, com análise de hábitos de consumo e gastos, em cidades com mais de 10 mil habitantes.

Essa alta de 29% no número de categorias compradas é a maior entre todas as classes de renda. Mais: nas camadas de menor poder de compra (D e E), o volume médio adquirido subiu 11% nos últimos quatro anos. Acima, portanto, da média de 5%. O gasto também teve elevação considerável entre os mais pobres, de 35%.

No alto da pirâmide social, o grupo de maior renda (A e B) apresentou aumentos mais discretos no consumo. A alta na quantidade de itens adquiridos por eles foi de 5% de 2003 a 2006, enquanto na classe C a expansão foi de 8%. Os gastos, porém, subiram na mesma velocidade (35% e 34%, respectivamente). “Percebeu-se não apenas uma elevação maior no volume comprado pelos grupos de renda menor como uma certa sofisticação nas compras. O acesso ao crédito fácil, inclusive no varejo de alimentos, e a deflação nos preços nos supermercados explicam, em parte, esse quadro”, disse Margareth Utimura, diretora comercial da LatinPanel.

Consumo prático Na lista de compras aparecem as mudanças. De 2003 para cá, os mais pobres passaram a gastar dinheiro com produtos classificados como práticos.

São itens como suco pronto para beber e massa instantânea, que respondiam por 24% dos gastos nas lojas há quatro anos e agora são 28%. Nessa mesma linha, os chamados produtos supérfluos ganharam espaço: são 33% dos gastos, contra 29% em 2001.

Para Denis Ribeiro, economista da Abia, que representa a indústria de alimentos, espera-se uma alta de 3,2% na produção do setor em 2006. A base é elevada: em 2005, o crescimento foi de 3,6%. “É preciso uma expansão sustentada. Crédito fácil precisa ser barato, com juros menores, resultado de um “spread” bancário menor. O dinamismo no consumo só vai continuar em 2007 se a expansão acontecer em cima de bases sólidas, com aumento na renda real, por exemplo”, afirmou Ribeiro.

Ana Claudia Fioratti, diretora da LatinPanel, concorda. “Não há esgotamento no endividamento da população, o que poderia fazer o consumo perder vigor. Mas é claro que uma expansão no rendimento calcada em programas sociais [como o Bolsa Família] não dará gás ao mercado por tempo indeterminado.”

Consumo tem leve queda no ano até agostoConforme a Folha antecipou em outubro, com base em análise da consultoria LatinPanel, houve leve queda no consumo no país em 2006. Foi o primeiro ano sob o governo petista com retração nesse indicador.

Os dados publicados ontem mostram ligeira redução de 1% no volume médio comprado até agosto, em relação a 2005, e queda de 1% nos gastos. Para Ana Claudia Fioratti, diretora da LatinPanel, essa redução representa estabilidade e não há expectativa de mudança no ritmo até o Natal.

Pelos dados, houve um aumento no tamanho da classe D e E entre 2002 e 2006 -passou de 10,1 milhões famílias para 16,5 milhões. A classe C pulou de 12,4 milhões para 15,6 milhões. Mas houve migração: 2,15 milhões de famílias saíram da classe D e E e migraram para a C de 2005 para 2006.

Para consumidor, produtos estão mais acessíveisMoradora de Ferraz de Vasconcelos, na região metropolitana de São Paulo, a copeira Maria Francisca de Souza, 52, aproveita a saída do trabalho, na região central da capital paulista, para comprar num supermercado popular os itens que faltam em sua despensa.

Com três sacolas de itens essenciais nas mãos, ela conta que, nos últimos anos, tornou-se um pouco mais fácil consumir uma série de produtos elaborados ou prontos para uso.

“Levo bastante suco”, conta. Na casa que divide com a filha de 28 anos, atualmente desempregada, sempre há massas, leite, maionese e caldo de carne e de galinha. “Acho que os preços estão melhores, pois o salário não subiu”, raciocina.

Além de produtos prontos para uso, ela também avalia que as frutas ficaram mais acessíveis nos últimos quatro anos. O problema, avalia, é que os preços de outros produtos continuam avançando e, por isso, é sempre necessário cuidado na hora de fazer as compras.

Já a enfermeira particular aposentada Neusa Valdez, de 70 anos, leva para casa, além das mercadorias básicas de consumo, alguns produtos para agradar aos quatro netos, como hambúrgueres.

Sucos, massas, caldos de galinha e de carne, extrato de tomate, leite longa vida e, principalmente, sabão em pó estão pesando menos na conta do supermercado, diz a aposentada, segurando quatro sacolas recheadas de alimentos e alguns produtos de limpeza.

Ela acredita, contudo, que muitos itens de consumo sofreram reajustes de preço após a eleição presidencial, no mês passado. A consumidora afirma que, mesmo quando encontra itens mais baratos no supermercado, compra só a quantidade necessária para a semana. “Não estou estocando, como fazia antigamente. É melhor voltar depois”, diz. “Até porque os preços não vão subir de repente como naqueles tempos.”

ADRIANA MATTOS

Folha de S. Paulo