Negócio é aprovado 11 dias após realização de leilão; grupo de trabalhadores não revela nome de parceiros estrangeiros

Compra da aérea ainda depende de depósito de R$ 170 mi; novos donos vão reduzir rotas e número de aviões em operação

Onze dias após o leilão em que fez a única proposta para a compra da Varig, o consórcio NV Participações -formado pelo grupo TGV (Trabalhadores do Grupo Varig) e investidores estrangeiros- tornou-se o novo dono da empresa. A proposta foi homologada pelo juiz Luiz Roberto Ayoub, da 8ª Vara Empresarial da Justiça do Rio.

“Entendemos que os esclarecimentos foram prestados e que foram apresentadas as garantias financeiras necessárias”, disse Ayoub sobre as exigências que a Justiça havia feito em relação à proposta de R$ 1,010 bilhão feita pelo consórcio. A NV vai gerenciar as linhas domésticas e internacionais da empresa e tem, a partir de hoje, 72 horas para depositar cerca de R$ 170 milhões como primeira parcela da compra.

O prazo acaba na sexta-feira. Quinta, dia do jogo do Brasil na Copa do Mundo, não será computado. Se não for feito o depósito, poderá haver um novo leilão das operações da empresa.

Segundo o coordenador do TGV, o piloto Márcio Marsillac, os trabalhadores contam com dois parceiros financeiros, mas os nomes só serão divulgados após o pagamento.

De acordo com Marsillac, os trabalhadores estão recebendo o controle da empresa aérea num momento em que a “Varig passa por uma “extrema-unção”, pressionada por fornecedores e credores”. A partir de hoje, o TGV vai implementar um plano de contigência na Varig e o número de aviões em operação cairá de 49 para 30. Serão priorizadas as rotas mais rentáveis até que o grupo consiga negociar novos prazos com as empresas de leasing.

Marsillac reclamou do Judiciário, que se negou a entregar a administração da Varig antes do pagamento dos R$ 170 milhões. Segundo ele, a nova diretoria será inteiramente modificada e será composta por executivos do mercado: “Nenhum funcionário de carreira da empresa permanecerá em posto de direção da Varig”, disse.

Há sérias dúvidas no mercado de que o TGV realmente disponha de dinheiro para comprar a empresa. Duvida-se também de que o grupo possa reformular a empresa para que seja viável: essa reformulação, por si só, demanda um investimento de grandes proporções.

Frustração

O leilão da Varig, que ocorreu no último dia 9, frustrou expectativas, já que as concorrentes do setor e as demais empresas que tiveram acesso aos dados financeiros da companhia não apresentaram propostas.

Já se esperava que companhias como TAM e Gol, que precisam prestar contas aos seus acionistas, não assumiriam o risco de fazer lances pela Varig, já que se sabia da possibilidade de o comprador herdar o passivo trabalhista e fiscal.

Na ocasião, entretanto, a companhia Ocean Air, do empresário German Efromovich, era citada como a mais forte candidata a fazer uma proposta pela Varig. O limite da empresa, entretanto, como se soube depois, era US$ 150 milhões, um valor muito menor do que o preço mínimo estabelecido: o valor inicial estimado para o modelo de venda da Varig Operações (que reúne linhas internacionais mais domésticas) era de US$ 860 milhões. O TGV ofereceu o equivalente a US$ 449 milhões pela companhia.

Aérea terá plano de contingência, com menos rotas e aeronaves em operaçãoA Varig deve adotar um plano de contingência a partir de hoje para contornar os pedidos de retomada de aviões pelas empresas de leasing. Segundo Marcio Marsillac, coordenador do TGV (Trabalhadores do Grupo Varig), o número de aeronaves em operação será reduzido de 49 para 30, mas os aviões retirados não serão entregues às companhias -vão permanecer parados.

Para o consumidor, a perspectiva é que os cancelamentos de vôos se tornem ainda mais freqüentes. Com menos aviões em operação, a Varig vai priorizar as rotas mais rentáveis. De acordo com o dirigente do TGV, o consumidor deve manter a calma porque os “trabalhadores assumiram a empresa para que ela não deixe de voar”.

Marsillac afirmou ainda que a Varig deverá encaminhar os clientes que tiverem vôos cancelados para outras companhias. O TGV tem reunião hoje com a administração da Varig. Tão logo consigam honrar o pagamento de US$ 75 milhões, os funcionários do TGV pretendem trocar a administração da aérea. “Nenhum funcionário de carreira será presidente. Temos que ter um conselho de administração com empresários experientes e uma diretoria executiva que entenda do negócio de aviação. Não vamos colocar técnicos da Varig para administrar ou gerir a empresa.”

Na avaliação do juiz Luiz Roberto Ayoub, o judiciário fez o que pôde para garantir a continuidade das operações da empresa. “Tudo o que foi possível ao Poder Judiciário fazer foi feito. Não poderíamos superar as barreiras legais”, disse.

Além da retomada de negociações com as empresas de leasing, o TGV terá que negociar com a BR Distribuidora, que estendeu o prazo de fornecimento de combustível até o fim do dia de hoje. Segundo a Folha apurou, a diretoria da Varig chegou a trabalhar com a possibilidade de encerrar as atividades ainda ontem.

O TGV deverá enfrentar resistência por parte de sindicatos de trabalhadores. Segundo Graziela Baggio, presidente do Sindicato Nacional dos Aeronautas, se o juiz homologou a proposta do TGV é porque assumiu que ela tem consistência. “Ele tem responsabilidade perante o Brasil. É importante dizer que os trabalhadores não foram consultados sobre a possibilidade de usar os créditos trabalhistas para comprar a empresa.” Esses créditos fazem parte da proposta de R$ 1,01 bilhão apresentada pelo TGV.

TAP

No fim de semana, a Justiça chegou a discutir a proposta de um consórcio formado por TAP, Air Canada e Brookfield. O presidente da TAP, Fernando Pinto, informou que volta hoje para Portugal. “Está tudo enrolado”, afirmou ontem à noite, após o anúncio da homologação da proposta do grupo. “Vamos torcer por eles [TGV].”

Questionado se o interesse na Varig será mantido se o TGV não depositar os US$ 75 milhões, ele afirmou: “Estamos sempre acompanhando o processo”. “Vamos ver se essa proposta vai para a frente.

JANAINA LAGE da Folha de S. Paulo