Planejamento teme efeitos de projeto que dá estabilidade a servidores não concursados

Ministro diz que seria criado um “hiperprecedente”; presidente da Casa acha difícil a aprovação, mas quer que parlamentares votem

O Ministério do Planejamento considera preocupante o impacto financeiro e jurídico que poderá causar à União, se aprovado na Câmara, o projeto que dá estabilidade no emprego a servidores públicos não aprovados em concurso. A colocação da proposta na pauta de votação foi anunciada anteontem pelo presidente da Casa, Arlindo Chinaglia (PT-SP).

“Essa proposta abre um “hiperprecedente”. Estamos falando de 260 mil servidores ou muito mais, porque ninguém sabe onde estão essas pessoas”, afirmou ontem o ministro Paulo Bernardo, que teme por uma distribuição indiscriminada de vantagens no funcionalismo. Apelidada de novo “trem da alegria”, a proposta de emenda à Constituição 54, de 1999, tem o objetivo de estender a estabilidade dos servidores do quadro da União a funcionários que ingressaram por indicação política na administração pública entre 1983 e 1988 -a Constituição de 88 deu estabilidade apenas aos não concursados que tinham mais de cinco anos de serviço público.

Na avaliação do ministério, a emenda não define se e como os funcionários beneficiados, hoje regidos pelas normas trabalhistas do setor privado, serão incluídos no quadro regular de servidores -uma lei posterior terá de tratar desse detalhamento. A área técnica não tem estimativa de quantos seriam beneficiados, mas no Congresso fala-se em 60 mil -no primeiro governo Luiz Inácio Lula da Silva, o quadro de civis teve aumento de 71,4 mil.

O que se considera mais preocupante é a possibilidade de a proposta ser ampliada para acolher pleitos que beneficiam outros dois tipos de servidores. Um deles torna efetivos funcionários contratados para serviços provisórios com mais de dez anos no cargo. Segundo representantes desse grupo, seriam cerca de 600 mil no país. O terceiro grupo são concursados que querem ser efetivados em instituições para as quais tenham sido requisitados.

Para o Planejamento, haveria dificuldades de enquadrar funcionários requisitados, temporários e celetistas de diferentes qualificações e níveis de remuneração nas carreiras existentes. Também por esse motivo, é impossível estimar o impacto da medida nas contas públicas.

Chinaglia acha difícil a aprovação, mas reafirmou que a proposta deve ser votada. “Esse projeto não está na pauta e não é prioridade”, disse. “Mas o que não pode é a gente trabalhar com a hipótese de uma Câmara assustada. Ela tem que ter coragem e responsabilidade de decidir e ser cobrada.”

Segundo o petista, a maioria dos líderes partidários assinou o requerimento de inclusão da proposta na pauta. Ele criticou a interpretação de que a Câmara estaria abrindo a porta para um “trem da alegria”. “Isso é rigorosamente especulativo. Traduzir isso como algo que já tenha acontecido é especulação. Estar na pauta não garante votação, menos ainda o que vai ser aprovado”, disse. Ele considera difícil a aprovação de todas as três vertentes do projeto.

O líder do DEM na Câmara, Onyx Lorenzoni (RS), se colocou contra as três propostas. “A porta do serviço público se dá pelo concurso, não dá para criar portas laterais.”

RANIER BRAGON e GUSTAVO PATU

Folha de S. Paulo

15/8/2007