Para o eleitor brasileiro, elevar a qualidade da educação é mais importante para a redução da pobreza do que os programas de transferência de renda, segundo a pesquisa de intenção de voto feita pelo Ipespe especialmente para o Valor. A pesquisa procurou medir as prioridades administrativas para o eleitorado. Como resposta à pergunta sobre quais deveriam ser as duas principais ações do próximo presidente para combater a pobreza, nada menos que 68% escolheram a opção “melhorar a educação”, ante 38% que optaram por “aumento do salário mínimo” e somente 19% que selecionaram “programas de transferência de renda como o Bolsa Família”, quinta opção selecionada.

A sondagem foi feita por meio de mil entrevistas por telefone no dia 25 de julho. A pesquisa representa o universo dos eleitores com acesso à rede telefônica em casa ou no local de trabalho. A margem de erro é de 3,2% para mais e para menos. Para o presidente do Conselho Científico do Ipespe, o sociólogo Antonio Lavareda, “isto significa que o uso de programas de transferência de renda na propaganda política como meio de captar votos já se esgotou para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT)” .

À pergunta “Quais deveriam ser as duas principais ações do próximo presidente para gerar empregos”, 44% dos pesquisados escolheram a diminuição dos impostos e 39%, a atração de indústrias e empresas para o Brasil. A reforma trabalhista, permitindo a flexibilização de direitos do trabalhador, foi a opção para apenas 2% dos pesquisados.

Nestas duas questões, não se percebem muitas diferenças entre o eleitor do ex-governador paulista Geraldo Alckmin (PSDB) e o de Lula. Os itens em que há maior diferença entre os eleitores são “incentivo às micro e pequenas empresas”, escolhido como fórmula para a geração de empregos por 25% dos lulistas e 20% dos eleitores de Alckmin, “aumento do salário mínimo”, com 45% das menções para Lula e 34% para Alckmin e “programas de controle de natalidade”, com preferência de 24% dos favoráveis ao tucano e 16% entre os lulistas.

Já o eleitor da senadora Heloísa Helena (P-SOL-AL) possui um corte ideológico um pouco mais preciso: prioriza acima de todos a reforma agrária, as melhorias na educação e a proteção para a indústria nacional. “Os dados sobre a senadora devem ser matizados pela base muito pequena, de apenas 9%, dos que se dizem favoráveis a ela, o que eleva muito a margem de erro. Já Lula e Alckmin mostram homogeneização”, disse Lavareda.

As diferenças se destacam nas perguntas sobre a violência. O eleitor de Lula é majoritariamente contra a pena de morte e o de Alckmin, a favor, em um contexto de muita divisão sobre o tema: 48% dos pesquisados são a favor da pena capital e 44% contra. Em relação à prisão perpétua, há uma maioria definida: 80% dos pesquisados aderem a este conceito e 15% se dizem contrários. “A parcela maior de eleitores de Alckmin favoráveis à pena de morte certamente está relacionada com a sua prevalência entre os com maior poder aquisitivo e das regiões Sul e Sudeste”, comentou Lavareda.

O desempenho administrativo foi apontado como a principal razão de rejeição tanto de Lula como de Alckmin. De acordo com o levantamento, 36% dos eleitores se identificam como antilulistas, afirmando que não o escolheriam “de jeito nenhum” na eleição de outubro. Destes, 30% afirmam que não votariam nele porque Lula “administra mal”, “está fazendo um mau governo” ou “não fez nada de bom”. O percentual de antilulistas que rejeita o presidente por ele ser do PT é de 16% e os que se afirmam decepcionados são 12%. O item “corrupção” é citado por 11% dos entrevistados.

A base contra o candidato tucano é menor: somente 26% dos pesquisados afirmaram rejeitá-lo. Destes, 25% apontam o critério administrativo para fazê-lo, afirmando que Alckmin “não foi bom governador”, enquanto 24% dizem rejeitá-lo por não conhecê-lo. Somente 8% dizem que não votarão em Geraldo Alckmin por ele ser do mesmo partido do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Para Lavareda, o peso da questão da corrupção na verdade seria maior em relação ao presidente. “Há um contágio desta questão entre os que se declaração decepcionados e os que dizem que ele administra mal. Tanto é que a avaliação da situação econômica permanece muito boa”, disse.

O questionário mostra que 73% dos pesquisados afirmaram que a sua situação financeira pessoal hoje está melhor do que há quatro anos e 74% declaram que a situação econômica do país melhorou ou ficou igual. “Por si só isto deveria ser suficiente para reeleger Lula. A maior parte da rejeição dele se deve aos acontecimentos que se tornaram públicos no ano de 2005, sobre mensalão e assuntos correlatos”, disse o sociólogo.

Já no caso de Alckmin, Lavareda lembra que a base menor torna mais alta a possibilidade dessa rejeição concentrar-se em São Paulo, onde houve uma oposição estruturada a seu governo. “Em termos nacionais, sua rejeição ainda é movida por desconhecimento, como se nota ainda com mais força entre o eleitorado que rejeita Heloísa Helena”, afirmou. Entre os 31% dos pesquisados que dizem que jamais votariam na alagoana, 43% citam como motivo não conhecê-la e somente 9% a classificam como “muito radical”.

A rejeição a Heloísa Helena, aliás, é o único item em que houve variação acima da margem de erro na intenção de voto entre a pesquisa atual e a feita há duas semanas. Os eleitores que deixaram de rejeitá-la migraram para a resposta “não conhece suficiente para opinar”, que subiu de 19% para 24%. “Graças à sua exposição no Jornal Nacional da Rede Globo, o eleitor a colocou em uma espécie de prateleira para observá-la. Este resultado significa que há abertura para migração de voto em favor dela”, disse Lavareda.

O percentual de eleitores que a rejeitavam, que era o mais alto entre os candidatos, com 38%, caiu para 31%, deixando-a em posição melhor que Lula. Na intenção de voto, Lula oscilou de 42% para 41%, Alckmin permaneceu com 27%, Heloísa Helena cresceu de 7% para 9%, Cristovam Buarque (PDT) permaneceu com 1% e os demais candidatos não pontuaram. Na pesquisa Ibope divulgada anteontem, Lula conseguiu 44%, Alckmin 27%, Heloísa Helena 8% e os demais candidatos somaram 3%. Pelo cenário levantado pelo Ipespe, a perspectiva ainda é de vitória no primeiro turno. No caso de a disputa alcançar o segundo turno. Nessa condição, Lula teria 46% e Alckmin, 39%.

César Felício do Valor Econômico