Com a inadimplência nas alturas e o início do calendário de restituição do Imposto de Renda (IR), os principais bancos do país voltaram a badalar entre os clientes suas linhas de antecipação dos créditos da restituição do IR e do décimo terceiro salário. E o brasileiro tem deitado e rolado no crédito farto: na Caixa Econômica Federal, a demanda pelo empréstimo antecipado do décimo terceiro cresceu 112% no primeiro semestre do ano, na comparação com igual período de 2005. No Banco do Brasil, o aumento foi de 240%.

As taxas aparentemente baixas — giram em torno de 2,5% a 3,38% ao mês — seduzem os correntistas, que acreditam estar fazendo um bom negócio e chegam a contratar várias linhas de crédito ao mesmo tempo. Especialistas, entretanto, alertam para o risco da farra de empréstimos: eles só devem ser tomados se for para quitar uma dívida mais cara, como a do cartão de crédito ou a do cheque especial. A taxa, que à primeira vista parece compensar, representa um rombo nas finanças a longo prazo.

Penhor da Caixa e crédito consignado são mais baratos

Juros mensais de 2,5% correspondem a uma taxa de 34,49% no período de um ano, bem acima da taxa de referência da economia, a Selic, que está hoje em 14,75% ao ano. Já um juro mais alto, de 3,83% ao mês, significa um desembolso de 56,99% no prazo de um ano.

— E, na verdade, esses juros são bem maiores porque há ainda a cobrança de uma taxa de abertura de crédito e o pagamento de IOF. Em média, o juro fica em 4% nestes empréstimos.Vale mais a pena do que pagar 5,5% ao mês no crédito pessoal, mas há modalidades mais baratas, como o penhor de jóias da Caixa, ao juro de 2,9% ao mês, e o crédito consignado, a partir de 1,5% ao mês. Qualquer que seja o crédito, não pode ser banalizado, virando uma espécie de cheque especial que estica o salário a curto prazo. Há um custo, e alto, para isso — diz Miguel Ribeiro de Oliveira, vice-presidente da Anefac (associação que reúne executivos de finanças).

Segundo José Humberto de Lira, diretor de Crédito da Caixa, o valor do empréstimo médio subiu de R$ 2.200 no ano passado para R$ 3.500 este ano nas linhas de antecipação do décimo-terceiro.

— O que verificamos é que, em sua maioria, são clientes que já contrataram essa linha no ano anterior e estão aproveitando para aumentar o empréstimo este ano. E há casos de clientes que contratam a linha do IR e a do décimo terceiro, já que a única restrição é a capacidade de pagamento — explica Lira.

Segundo Denilson Molina, gerente-executivo da Diretoria de Varejo do Banco do Brasil, já foram feitas, apenas no primeiro semestre, 60 mil contratações da linha do décimo terceiro, num total de R$ 35 milhões. E, apenas em julho, mais R$ 14 milhões.

— A procura só cresce — atesta Molina.

No crédito do Imposto de Renda, foram 150 mil operações registradas no BB no primeiro semestre, totalizando R$ 200 milhões em adiantamentos.

— Essa farra de crédito é uma bomba de efeito retardado. Há pessoas que estão contraindo novos empréstimos para consumir, sem conter a sangria que levou às dívidas que já têm. Pegar empréstimo é uma situação emergencial que deve ser evitada ao máximo e só é aconselhável para quem vai usar o dinheiro para quitar uma dívida mais cara — afirma o economista Luís Carlos Ewald, professor da Fundação Getulio Vargas.

Roberto Zentgraf, coordenador do MBA em Finanças do Ibmec-RJ, levanta outra grande desvantagem do empréstimo:

— No caso das linhas que antecipam o crédito do IR, por exemplo, o dinheiro que ainda não foi pago pelo Leão, está sendo remunerado a juros de 14,75% ao ano. É uma aplicação compulsória que acaba sendo um bom negócio para quem puder esperar o pagamento.

Zentgraf faz a conta. Quem tem mil reais de restituição e demora um ano para receber os recursos, terá, no fim do prazo, R$ 1.1147,50 (restituição mais os juros do período). Mas se pegasse a linha de crédito de menor custo — 2,5% ao mês — pagaria R$ 1.344,89 ao fim do mesmo período, tendo, após um ano, uma despesa de quase R$ 200 apenas em juros.

— A pessoa acaba pagando 20% do que receberia de restituição em juros ao bancos. É um péssimo negócio. Só é alternativa para quem está afogado em dívidas mais caras — diz Zentgraf.

Patricia Eloy / O Globo