Ministro convence diretor da PF a ficar três meses no cargo, mas permanência por mais tempo ainda depende de acerto. Delegado quer garantia de aumento para a corporação e ampliação do efetivo

Para dar credibilidade, logo na partida, à sua gestão no Ministério da Justiça, o recém-empossado Tarso Genro busca convencer o atual diretor da Polícia Federal, Paulo Lacerda, a continuar no cargo. O delegado dirigiu a instituição nos primeiros quatro anos de administração petista e chegou a declarar que deixaria o posto assim que o ex-ministro Márcio Thomaz Bastos desembarcasse do governo. A pedido de Tarso, Lacerda passou a reconsiderar a aposentadoria. A permanência dele no posto, porém, dependerá da habilidade do novo ministro em construir uma relação de confiança.

Os dois definiram três meses de prazo para azeitar o diálogo, o que dependerá do que Tarso oferecer a Lacerda. O diretor confidenciou a assessores que fica no cargo se a instituição tiver condições de realizar mais do que fez durante o primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, um dos entusiastas do policial no governo. Entre 2003 e 2006, a corporação realizou 320 operações, das quais 125 voltadas para desbaratar quadrilhas especializadas em crimes contra a administração e os cofres públicos. Em apenas 12, foram apuradas fraudes referentes a mais de R$ 67,8 bilhões.

Os primeiros 30 dias servirão de termômetro. Se até lá os dois perceberem que a relação não vingará, um novo chefe da PF será escolhido. Lacerda espera do novo ministro sinal verde para adotar medidas em benefício dos policiais, caso do aumento salarial prometido à categoria no ano passado (leia mais nesta página). O atual diretor quer também ampliar o efetivo policial, que hoje é de 13 mil servidores, e implementar a Lei Orgânica da PF. A legislação prevê regime disciplinar, reestruturação de cargos e atribuições da carreira, além de autonomia e independência da Corregedoria da instituição. A corporação existe há pouco mais de 40 anos, mas é regida por uma antiga lei, anterior à sua criação.

A possível permanência de Paulo Lacerda à frente da polícia também passa pelo preenchimento dos cargos de direção. O delegado conseguiu do ex-ministro Márcio Thomaz Bastos a garantia de que não haveria interferências políticas na indicação de delegados para ocupar, por exemplo, postos de superintendentes regionais, cargos também cobiçados por líderes partidários.

Divisão

Ontem, ao participar de reunião com representantes de entidades de classe ligadas à Polícia Federal, o ministro Tarso Genro percebeu como a sucessão na polícia é controversa. Lacerda não é uma unanimidade. O presidente da Federação Nacional de Policiais Federais (Fenapef), Marcos Wink, disse que o nome do atual diretor não agrada. “Ele administrou pensando apenas em uma categoria”, disse Wink, numa referência aos delegados. O presidente da Fenapef é agente policial.

O delegado Sandro Avelar, presidente da Associação Nacional de Delegados da Polícia Federal (ADPF), saiu em defesa do atual diretor. “Lacerda fez uma excelente gestão à frente do departamento e merece o reconhecimento”, afirmou. Ao deixar o encontro com os dirigentes sindicalistas, ocorrido na sede na Fenapef, Tarso Genro evitou se alongar sobre o tema: “Esqueça a saída de Paulo Lacerda pelos próximos três meses. Se é que vai ocorrer uma eventual saída.”

Policiais anunciam greve para amanhã  

Agentes e delegados da Polícia Federal prometem entrar em greve amanhã por 24 horas. O protesto é uma resposta ao não cumprimento de acordo firmado com o governo federal no ano passado. Representantes sindicais da categoria em todo o país anunciaram que manterão apenas os serviços essenciais. A emissão de passaporte, por exemplo, ficará suspensa.

Os servidores negociaram um reajuste salarial como forma de repor perdas acumuladas nos últimos 10 anos. A categoria conseguiu uma reposição de 35% — a remuneração transformou-se em subsídio e as gratificações foram somadas ao salário-base. Com isso, o aumento variou de 5% a 20%, mas houve casos de reajuste zero. O acerto com o Ministério do Planejamento previa uma nova compensação, também de 35%. De acordo com os policiais, isso até hoje não ocorreu.

Para tentar evitar desgaste ao governo em início de segundo mandato, o ministro da Justiça, Tarso Genro, tentou negociar ontem com a categoria, em encontro na sede da Federação Nacional de Policiais Federais (Fenapef). Várias entidades haviam pedido audiência com o petista e ele optou por marcar um encontro com todos. Mas não houve acordo entre o ministro e os representantes dos servidores.

Legalidade

Ao deixar a reunião, Genro disse que o governo respeita o movimento “desde que ocorra dentro da lei e da democracia e que prevaleça a responsabilidade e o espírito público”. E que a visita — a primeira que um ministro realiza à principal entidade de representação dos policiais federais —, é uma sinalização da importância que o governo dá à instituição e do seu compromisso em continuar a luta contra o crime organizado e pelo fortalecimento da categoria.

“Minha visita aqui hoje reforça o compromisso de trabalhar pela valorização da categoria. As reivindicações dos policiais federais serão tratadas com o Ministério do Planejamento”, afirmou o ministro, que se comprometeu a levar a reivindicação dos policiais federais até o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo. (Luciano Pires e Marcelo Rocha)

ANISTIA TERÁ NOVO COMANDO

O ministro Tarso Genro convidou o advogado gaúcho Paulo Abrão para o cargo de secretário da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça. Ele vai substituir o advogado e ex-presidente da OAB Marcelo Lavenére, que pediu afastamento. Paulo Abrão é professor da PUC de Porto Alegre e especialista em direito público e tributário. A comissão analisa os pedidos de indenização feitos por perseguidos pelo regime militar. Nos últimos anos, enfrentou polêmica pelo alto valor de algumas indenizações. 

Marcelo Rocha

Correio Braziliense

27/3/2007