Coordenadores do MLST querem processar o presidente da Câmara por danos morais. Eles voltam aos estados com recomendação de fazer manifestações para pressionar pela libertação dos 42 ainda presos

Enquanto os principais líderes do Movimento de Libertação dos Sem Terra (MLST) continuam presos no Complexo Penitenciário da Papuda, acusados pelos ataques de vandalismo ao Congresso, a ordem entre os demais militantes é reorganizar e manter a mobilização. Em assembléia na madrugada de sábado, no Centro de Formação Vicente Canhas, próximo a Luziânia (GO), para onde foram levadas as 540 pessoas liberadas do presídio, discutiu-se uma pauta de ações para esta semana. A principal delas é pressionar as autoridades federais para tentar libertar aqueles que ainda estão detidos. “Essa é uma prisão política”, afirmou Aparecido Ramos, um dos 45 coordenadores nacionais do MLST.

O grupo pretende processar o presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), por danos morais. “Nos trataram como bandidos, mas no movimento não tem bandido. Fomos maltratados e, por isso, os advogados já receberam o nosso aval para entrar com uma ação na Justiça contra o Aldo, que manchou sua trajetória política ao determinar essa prisão”, acrescentou Ramos. No sábado, ele chegou ao centro de formação a bordo de um VW Gol prata modelo 2006 alugado de uma locadora de veículos — com o qual, cuidava dos detalhes para despachar aos estados as 540 pessoas liberadas da prisão.

Sobre a polêmica formada em torno do dinheiro que manteria o MLST, Ramos disse que os recursos são provenientes de sindicatos e outras entidades sociais. Partidos, caso do PT, também contribuem, segundo ele. “Dentro do PT existem os que são contra e outros que são a favor do nosso movimento. Existem parlamentares do partido que são comprometidos com a luta de centrais como a Contag, a CUT e o MLST também. Você não vai querer dizer que eles não contribuem, vai?”.

O militante negou que verbas federais repassadas à Associação Nacional de Apoio à Reforma Agrária (Anara) — entidade ligada ao movimento e que tem Bruno Maranhão como um dos responsáveis — cheguem ao MLST, mas admitiu que, indiretamente, são beneficiados porque a entidade presta apoio na contratação, entre outros, de profissionais de agronomia para dar suporte técnico aos assentados. A associação recebeu R$ 5,7 milhões da União nos últimos cinco anos, dos quais R$ 5,6 milhões durante a administração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Entrevista / normando fernandes

“Algumas situações precisam ser revistas” 

Passado o susto, Normando Fernandes, diretor da Coordenação de Apoio Logístico da Segurança da Câmara, reuniu a família ontem, na casa dos pais, para celebrar “o retorno”. Vítima de traumatismo craniano depois de receber uma pedrada durante a invasão do MLST ao Congresso na última terça-feira, Fernandes deixou o hospital no sábado depois de três dias internado numa UTI.

Normando é um dos quatro diretores da Segurança da Câmara que estava na linha de frente durante o confronto com os mais de 500 integrantes do MLST. Enquanto esteve internado, ele recebeu a visita do presidente da Casa, Aldo Rebelo (PCdoB-SP). “Ele me abraçou silencioso. Agradeci. Entendo o lado dele. Se determinasse a entrada do Bope (Batalhão de Operações Especiais da PM) poderia ser pior”, afirmou.

Afastado do trabalho por 60 dias, prazo estipulado pelos médicos para se recuperar dos ferimentos, o segurança garante que voltará à função de polícia legislativa. “Nada vai mudar a minha rotina”, disse. Normando enfatiza ainda a necessidade de revisão nas condições de trabalho da segurança da Casa. Ele é concursado desde setembro de 1993. O salário de um diretor de segurança da Casa chega a R$ 10 mil.

Sobre os ataques de vandalismo, diz não ter visto quem jogou o paralelepípedo que o atingiu na fronte, mas lembra de cada detalhe da cena do combate entre seguranças e os integrantes do MLST. “Depois que estouraram a porta de vidro da entrada do Anexo II senti que a situação tinha saído do controle. Entrei na Casa e virei para olhar para trás. Foi quando recebi a pedrada e caí”, afirma.

O senhor lembra quem o atingiu?

Não. Depois que estouraram a porta de vidro senti que a situação tinha saído do controle. Eram cinco policiais militares e 25 agentes contra 500 (integrantes do MLST). Entrei na Casa, mas virei para olhar para trás. Foi quando recebi a pedrada e caí. Lembro que caminhei até o posto médico da Câmara dos Deputados e conversei com o médico. Depois acordei no hospital. Tive uma convulsão. Com 13 anos de experiência em segurança, não tinha como prever a invasão?

Estávamos ali para acompanhar uma manifestação pacífica e ordeira do Sindijus (Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário), como várias outras. Eles chegaram de uma vez. Foi tudo muito rápido. O pessoal da inteligência da Polícia Militar não tomou conhecimento da chegada do MLST em Brasília. O que muda na sua vida profissional?

Quando acordei no hospital, pensei na minha filha (Giovanna) de três anos e perguntei por ela. Algumas situações precisam ser revistas. Não temos as mesmas condições regimentais que outras categorias policiais. Mas, nada vai mudar a minha rotina. Gosto do que faço. Recebeu alguma visita importante?

Do deputado Aldo Rebelo (presidente da Câmara). Ele me abraçou silencioso. Agradeci. Entendo o lado dele. Se determinasse a entrada do Bope (Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar) poderia ser pior.

Visita de advogados

Os 42 integrantes do MLST que, até ontem à noite, permaneciam presos no Complexo Penitenciário da Papuda receberam a visita de advogados nesse domingo. Eles discutiram a estratégia de defesa, para tentar sair da cadeia. A 10ª Vara da Justiça Federal, responsável pelo processo contra os sem-terra, deverá analisar a partir de hoje o pedido de liberdade provisória para o grupo. Entre eles estão Bruno Maranhão, o líder do movimento e ex-integrante da Executiva do PT.

Os militantes responderão processo por lesão corporal grave, atentado ao patrimônio público e incitamento de menores. Com pedras e pedaços de paus, os sem-terra destruíram portas de vidro e equipamentos de informática. Um veículo, que estava no saguão da Casa e seria sorteado na festa junina dos funcionários da Câmara, também foi destruído. Um dos diretores da Segurança da Casa, Normando Fernandes, teve traumatismo craniano depois de ser atingido por um paralelepípedo.

Mais de 500 pessoas foram presas depois dos ataques de vandalismo e levadas para a Papuda. Na última sexta-feira, por sugestão do Ministério Público Federal, a Justiça mandou soltar 540 integrantes do MLST e manteve 42 presos, contra os quais a Polícia Federal conseguiu reunir provas de participação no episódio. Pelo menos 12 advogados cuidam da defesa dos sem-terra. (MR) 

Marcelo Rocha do Correio Braziliense