Últimas horas indicam erosão no apoio a Renan Calheiros, mas o senador mantém a aposta no voto secreto e na sessão fechada
À frente da imagem de Nossa Senhora de Nazaré, Renan pediu bênção à santa
A única concordância entre os aliados do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e os que lutam por sua cassação é que não há como prever com certeza o resultado da votação de hoje. A contabilidade das duas alas indica uma disputa apertada, a ser decidida por um pequeno grupo de senadores que continua a esconder sua posição. O clima é de nervosismo e desconfiança. Cada lado esforça-se para identificar e conter seus traidores.
Na véspera do julgamento, tanto os aliados quanto os adversários de Renan estimavam haver cerca de 35 votos consolidados para cada lado e entre 11 e 15 “inescrutáveis”. Para que Renan seja cassado, é preciso que 41 dos 81 senadores votem pela perda do mandato. Qualquer outra posição, como ausência ou abstenção, conta a favor da absolvição. A regra transfere aos adversários dele a obrigação de conseguir a maioria absoluta. Mas nos últimos dias, o clima político dentro do Senado piorou para Renan, como até seus aliados reconhecem. O presidente do Senado tem recebido uma má notícia atrás da outra. Sua principal tarefa tem sido estancar a perda de votos.
Ontem, por volta do meio-dia, ele recebeu um telefonema do senador Garibaldi Alves (PMDB-RN). Constrangido, o senador comunicou a Renan ter decidido votar pela cassação e que anunciaria publicamente o voto. Discreto e avesso a brigas políticas, Garibaldi era contabilizado na lista de votos pela absolvição. Mudou de idéia por questões regionais. Seu adversário local, o senador José Agripino (DEM-RN), ganhou um enorme destaque na mídia ao tornar-se um dos líderes do movimento para cassar Renan. Ele não quis ficar contra a opinião pública.
“Se Renan for absolvido, a crise não acabará”, justificou Garibaldi, lembrando que ainda há três representações contra o senador no Conselho de Ética. “Preciso pensar no Senado”. Esse é o argumento que mais preocupa os aliados de Renan. O medo de que os senadores votem pela cassação num gesto de autopreservação, para tentar encerrar a crise política.
Como aposta no voto secreto, Renan faz pouco caso do clima negativo criado nos corredores do Senado. Acha que os senadores que votarão com ele são os que não dão entrevistas e muito menos fazem discursos em plenário. Contabiliza até mesmo o apoio de parlamentares que têm proclamado a intenção de votar pela cassação, como Romeu Tuma (DEM-SP) e João Pedro (PT-AM). Eles votaram pela cassação no Conselho de Ética e juram que vão repetir a posição no plenário.
As más notícias se acumulam. O PT, com quem Renan contava como aliado, liberou sua bancada e está dividido (leia mais na página 3). Mesmo dentro do PMDB, entre cinco e sete senadores votarão pela cassação. Ao mesmo tempo, os partidos de oposição lutam para enquadrar os dissidentes pró-Renan (leia na página 4). Ontem o PSDB fechou questão e proclamou ter acertado 12 dos seus 13 votos.
Tempo contra
Renan sabe que essas notícias podem contaminar o clima em plenário e virar votos de parlamentares indecisos. “O tempo trabalha contra Renan”, reconhece o líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR), um de seus mais fiéis aliados. “O quadro só vem piorando, mas hoje é imprevisível”. Por isso, o presidente do Senado passou o dia de ontem ao telefone, amarrando votos. Mantém um discurso otimista e diz esperar os mesmos 51 votos que teve em fevereiro, quando foi reeleito presidente. Seus aliados acham que essa conta é feita para animar as tropas mas não é realista.
Ele também teme ser enfraquecido pelos boatos de que pode renunciar ou licenciar-se da Presidência do Senado antes da votação ou mesmo se for absolvido por uma pequena margem. Ontem, voltou a negar a possibilidade. “Qualquer coisa que diga respeito a licença ou renúncia não faz parte da minha personalidade”. Apesar disso, as articulações para sucedê-lo já correm soltas em todos os partidos. Ontem, um de seus aliados, o ex-senador Gilberto Miranda, deu corda à especulação. Telefonou para vários senadores pedindo votos para Renan. Ao senador Gerson Camata (PMDB-ES), perguntou se ele aceitaria votar pela absolvição em troca da promessa de que Renan deixaria a Presidência. Camata não aceitou e anunciou seu voto pela cassação.
No último dia antes de ser julgado, o senador fez o possível para aparentar tranqüilidade. Presidiu a sessão do Senado, uma homenagem ao Círio de Nazaré, a grande procissão do Pará em louvor a Nossa Senhora de Nazaré. Um prestimoso assessor colocou em sua mesa a imagem da santa. Renan fez um breve discurso, sem citar a crise. Encerrou com um pedido com jeito de oração. “Que Nossa Senhora nos abençoe a todos.”
Gustavo Krieger
Da equipe do Correio
Ritual secreto
Na sessão secreta que julgará hoje o mandato do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL),dois dos três relatores, Renato Casagrande (PSB-ES) e Marisa Serrano (PSDB-MS), se dividirão na defesa da cassação do senador. Casagrande apontará irregularidades na evolução patrimonial do peemedebista. Serrano ficará com a tarefa de questionar a relação do senador com um lobista para pagar despesas pessoais. Caberá a Almeida Lima (PMDB-SE), o terceiro relator, repetir o discurso pela absolvição do senador. Os relatores falarão durante a discussão do processo, o primeiro passo da sessão de hoje. Além deles, qualquer senador poderá se inscrever e discursar por 10 minutos. Demostenes Torres (DEM-GO) e a líder do PT, Ideli Salvatti (SC), por exemplo, avisaram que não abrem mão de usar o microfone. Após a discussão, a palavra será dada ao PSol, autor da representação contra o senador. A presidente do partido, ex-senadora Heloisa Helena (AL), foi indicada pela legenda para defender, em 30 minutos, a perda do mandato de Renan. Logo depois, um advogado do presidente do Senado e o próprio terão o mesmo tempo para rebater e, pela última vez, pedir aos 80 senadores a rejeição do relatório aprovado no Conselho de Ética. A votação começa em seguida: secreta e eletrônica. O vice-presidente do Senado, Tião Viana (PT-AC), terá a missão de presidir a sessão e anunciar o resultado.
O julgamento
Acusação
Renan é acusado de ter recebido ajuda de um lobista para pagar pensão à jornalista Mônica Veloso, com quem tem uma filha de três anos. A perda do mandato foi aprovada pelo Conselho de Ética por 11 votos a quatro
Sessão do plenário
Começa aberta por alguns minutos e depois torna-se secreta. A sessão será presidida pelo vice-presidente do Senado, Tião Viana (PT-AC)
Início
11h
Tempo de sessão
Quatro horas e meia, prorrogáveis
Presentes
Os 81 senadores, a secretária-geral, Cláudia Lira, o secretário-adjunto, José Roberto Leite de Matos, um advogado do PSol (autor da representação) e um de Renan
Discussão
Será aberta a discussão para que senadores inscritos possam falar sobre o processo. Os três relatores do Conselho de Ética terão a prerrogativa de falar no final. Cada senador poderá usar a palavra por, no máximo, 10 minutos. Não há previsão de orientação por parte dos líderes para suas bancadas
Acusação e defesa
Um representante do PSol e/ou o senador José Nery (PSol-PA) poderão fazer a acusação dentro de um prazo de 30 minutos. Logo depois, um advogado de Renan e o próprio senador terão o mesmo tempo para a defesa
Votação
Após os discursos dos senadores, a acusação e a defesa, começa o processo de votação secreta e eletrônica. Os 81 senadores, incluindo o próprio Renan, podem votar
Resultado
O senador Tião Viana proclama o resultado aos senadores. Depois, reabre a sessão e informa o placar novamente. São necessários, pelo menos, 41 votos para que Renan seja cassado. Se isso ocorrer, o peemedebista perde o mandato e fica oito anos impedido de disputar qualquer cargo eletivo. Em caso de absolvição, o processo é arquivado
Leandro Colon
Da equipe do Correio
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