A proximidade dos grandes eventos esportivos que o Brasil sediará, somada ao crescimento do consumo de drogas nas grandes cidades, fez com que a opinião pública voltasse os olhos para o gargalo existente na fiscalização das fronteiras brasileiras. Cansados de ter de arcar sozinhos com o custo político do aumento da violência, governadores e prefeitos também passaram a culpar – não sem razão – as fronteiras pela origem de males que tanto afligem as grandes cidades.

De fato, a fiscalização é precária, tanto nos 16.886 quilômetros de fronteiras terrestres quanto em portos e aeroportos. Faltam recursos humanos e materiais para o trabalho, o que possibilita que ano após ano toneladas de drogas e de produtos contrabandeados adentrem o Brasil para financiar as operações do crime organizado.

Pressionado a dar resposta ao problema, o Governo agiu no modo automático, apresentando, em junho de 2011, Plano Estratégico de Fronteiras que basicamente promete dobrar o efetivo policial na região. A maior ação nesse sentido ocorreu no último dia 28 de dezembro, com a nomeação de 618 novos policiais federais. Para 2013, há previsão de nomeação de outros 600. A maior parte será lotada em regiões de fronteira.

Tais medidas dão impressão de que o problema advém simplesmente do baixo quantitativo de policiais. Não é o caso. A escassez de policiais na fronteira está intimamente ligada à gestão ineficiente dos recursos humanos da Polícia Federal, em especial no que diz respeito a sua atividade meio. Algo que vai muito além da questão fronteiriça.

Para que o trabalho dos policiais seja bem sucedido, é necessário todo um suporte logístico, realizado pelos servidores administrativos do Plano Especial de Cargos da Polícia Federal (PECPF) – a atividade meio. Ocorre que esses profissionais há anos são menosprezados na instituição, sendo mal remunerados em vista das complexas atividades que desempenham, que vão desde o atendimento psicológico dos policiais até a instalação de redes de telecomunicação nas operações, entre tantas outras.

A situação tem motivado a saída de inúmeros profissionais dos quadros do PECPF, que deixam a PF em busca de melhores empregos. O último concurso promovido para o setor foi realizado em 2004, e cerca de 50% dos aprovados já deixaram o órgão. Hoje, são 795 cargos vagos na carreira administrativa e estudo da própria PF aponta a necessidade de abertura de novas 3 mil vagas.

Sem contar com número suficiente de servidores administrativos para tocar as atividades de suporte, a PF se vê obrigada a deslocar policiais da linha de frente do combate ao crime para tais postos, apesar do descompasso existente entre a remuneração das duas atividades, com policiais recebendo até cinco vezes mais. Muitos dos policiais desviados de função são egressos de regiões fronteiriças. Alguns veem o deslocamento como verdadeiro bônus, afinal, nada melhor que trocar as privações e dificuldades do trabalho policial nas fronteiras pela burocracia de Brasília.

Em artigo publicado no Correio Braziliense em 02/01/2013, o diretor da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef) Josias Fernandes aponta que 50% do efetivo policial atua hoje em funções administrativas. Na prática, o que ocorre é o superfaturamento da atividade meio da PF, com o agravante da diminuição de efetivo na atividade policial. A administração pode não estar agindo de má-fé, mas incorre em improbidade, e o cidadão precisa estar consciente de que é ele quem paga por tal desperdício.

Para piorar, quando não recorre ao desvio de função de policiais, a PF aceita desviar terceirizados contratados como recepcionistas e digitadores para atividades exclusivas de servidores públicos. O resultado disso pode ser mensurado nas reclamações de mau atendimento e, em casos mais graves, na corrupção desses funcionários por quantias irrisórias de dinheiro.

A segurança pública é hoje prioridade para a sociedade, por isso, soluções imediatistas devem ser abandonadas. Chega de meros paliativos para os problemas estruturais do setor. Valorizar o servidor administrativo, por meio da reestruturação de sua carreira e a realização de novo concurso para a área, é a solução para os problemas de desvio de função de policiais e de terceirização irregular.

Não se trata de igualar administrativos a policiais, mas de reconhecer a importância e o papel de cada um, garantindo que as diferentes engrenagens que movem a segurança pública sejam encaixadas nos espaços corretos, em benefício de toda a população.