Aeronáutica monta ação de guerra para evitar tumultos nos aeroportos e garantir volta tranqüila

Enquanto a aparente calmaria reinou nos aeroportos no domingo, a agitação marcou o Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle de Tráfego Aéreo (Cindacta 1), em Brasília. Para evitar o caos no espaço aéreo brasileiro e garantir o retorno com segurança de quem viajou no Feriado do Dia de Finados, o comando da Aeronáutica montou uma operação de guerra para afastar o risco de novos congestionamentos no corredor aéreo da região.

Depois da bronca do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o próprio comandante da Aeronáutica, tenente-brigadeiro-do-ar Luiz Carlos Bueno, assumiu a responsabilidade pela operação e passou parte do dia ontem na Base Aérea de Brasília, no Lago Sul, onde funciona o Cindacta. A situação dele no governo é complicada. Vários oficiais do Alto Comando também permaneceram nas instalações do centro. Além da medida para assegurar o funcionamento do controle aéreo, houve ainda o remanejamento de vôos comerciais, na tentativa de evitar os tumultos ocorridos na quinta-feira. A decisão foi tomada em conjunto pelas empresas aéreas e autoridades militares.

A estratégia de convocar 149 controladores de vôo, anunciada ainda na quinta-feira pelo brigadeiro Bueno, surtiu o efeito psicológico necessário e parece ter evitado o agravamento do apagão aéreo. Até o fechamento desta edição, às 23h, não ocorreram tumultos e os atrasos registrados pelas companhias aéreas foram minimizados. O maior problema ocorreu no Rio de Janeiro, que registrou 27 atrasos, em média de meia hora, ao longo do dia.

Ao longo dos últimos dez dias, a operação-padrão desencadeada pelos controladores de tráfego aéreo provocou mais de 5 mil atrasos de vôos em todo o sistema aeroportuário brasileiro, de acordo com dados da Infraero. Isso representa 35% do fluxo do total de 14,7 mil pousos e decolagens de aeronaves. No período, o número de vôos cancelados chegou a 8% do total: 1.176.

Segurança

De acordo com relatos de operadores, o esforço da Aeronáutica de garantir tranqüilidade aos passageiros ignorou a escala de oito horas de trabalho com 48 horas de folga dos profissionais do tráfego aéreo. Durante toda a manhã, a movimentação no Cindacta era visível pelo entra e sai de veículos, além do estacionamento lotado de carros, inclusive com placas oficiais.

A presença física do Alto Comando tornou o ambiente de trabalho mais tenso nas salas de controle. Sob pressão, os controladores de vôo do Cindacta 1 permaneceram trabalhando quase no limite para garantir o fluxo de 113 aeronaves que deveriam passar no Aeroporto Internacional de Brasília. Em todo o país, foram 1.752 operações de pouso e decolagem

Segundo operadores disseram ao Correio, o esquema montado pela Aeronáutica não respeitou as regras de segurança. “Olhando no radar não dá para acreditar no tanto de avião que tem no céu”, disse um controlador. Alguns militares chegaram a passar mal devido ao alto nível de estresse e tensão durante o dia de ontem. “Tem gente trabalhando doente, com conjuntivite. Um colega vomitou de tão nervoso”, relatou.

De acordo com outro controlador de vôo, que veio de São Paulo para reforçar a equipe em Brasília, ontem havia nada menos que 40 operadores de olho nos radares e monitores do sistema de controle do espaço aéreo do Cindacta 1. O grupo de gerenciamento de crise, instalado no Rio de Janeiro, montou um esquema de remanejamento de vôos junto com as principais companhias aéreas nacionais, para garantir o fluxo.

Nos aeroportos também era visível o esforço para evitar o caos do início do feriado. Apesar de não confirmarem, as empresas aéreas trabalharam com um número maior de pessoas no atendimento do embarque para check-in e no despacho de bagagens.

Calma

Como nos demais aeroportos, o dia de domingo foi tranqüilo em Brasília. Logo cedo, o movimento de passageiros nos guichês foi intenso — habitual em fins de feriado. Porém, as filas não duraram muito tempo. Não houve cancelamento de vôos ou atrasos de pousos e decolagens das aeronaves. Apenas dois vôos chegaram ou deixaram a capital com mais de 30 minutos de atraso.

O primeiro foi um avião da TAM, cujo destino era a cidade de Manaus (AM), que deveria ter partido de Brasília às 10h e só saiu às 10h40. Depois, outra aeronave da mesma companhia, que veio do Rio de Janeiro (RJ), demorou 45 minutos a mais que o previsto (12h30) para aterrissar em Brasília.

Alguns passageiros se surpreenderam com a facilidade que tiveram para embarcar. Esperavam encontrar guichês mais movimentados e vôos atrasados nos aeroportos. Afonso Henrique Pedrosa, 46 anos, estava apreensivo antes de chegar ao aeroporto. “Fiquei preocupado por conta das notícias sobre os aeroportos, mas está tudo normal”, disse o oficial do Exército.

Luise Queiroz Maliska, 32 anos, e o marido, Clóvis Maliska, deixaram Curitiba (PR) perto das 9h da manhã. Recém-casados, cochilavam enquanto esperavam a conexão para Recife, onde passarão a lua-de-mel. Ainda cansados por conta da festa de casamento, aproveitaram o tempo livre para colocar o sono em dia. “Estava morrendo de medo de ter algum atraso e perdermos parte da viagem no aeroporto”, comentou a advogada.

Para a socióloga Thaís Delgado, 29, o vôo que fez na manhã de ontem foi o mais tranqüilo de sua vida. O avião saiu pontualmente de Campinas e chegou no horário previsto em Brasília. Grávida de seis meses, ela tinha tentado percorrer o mesmo trajeto na última quinta-feira. Thaís vinha de mudança para a capital, onde o marido já mora.

Depois de esperar por quase 12 horas, a socióloga desistiu de embarcar no Dia de Finados. Transferiu a passagem para o domingo, com medo de que a sexta-feira e o sábado fossem continuar tumultuados. “Já tinha transferido a passagem quando ouvi que poderia ser pior tentar vir hoje. Mas foi ótimo. Deu tudo certo”, comemora. O marido de Thaís, Victor Tagore, 29, a recebeu com flores no aeroporto e vibrou com a chegada da mulher.  

Pouso forçado em São Paulo

Um avião da Gol fez ontem um pouso de emergência no Aeroporto de Cumbica, em Guarulhos, na Grande São Paulo, depois que o piloto detectou problemas no flap, uma peça da asa da aeronave. O vôo 1751 partiu de Goiânia com destino a Congonhas, na Zona Sul da capital. Segundo a assessoria de imprensa da companhia, a previsão era de que o avião chegasse em São Paulo por volta das 10h, mas como o vôo saiu com atraso, mudou para as 12h. Durante o trajeto, o piloto percebeu o problema na peça e decidiu aterrissar em Cumbica por volta das 13h30.Os passageiros foram deslocados de ônibus para Congonhas. A aeronave deve permanecer até às 17h30 no Aeroporto de Guarulhos para manutenção.  

Infraero aliviada

O presidente da Infraero, brigadeiro José Carlos Pereira, considerou um sucesso as medidas emergenciais tomadas para conter a crise gerada pela operação-padrão dos controladores de vôo, mas alerta para a necessidade de ações definitivas. Para resolver o problema que gerou um caos nos aeroportos de todo o país nos últimos 10 dias, é preciso investir em contratação de pessoal compra e modernização de equipamentos e aumento de recursos destinados ao setor.

O brigadeiro não soube prever até que prazo as medidas de reforço da operação de controle aéreo surtirão efeito. “Até quando essas medidas emergenciais vão manter o ritmo normal nos aeroportos, se duas semanas, três semanas, até o Natal ou ano novo, nós não sabemos”, afirmou. Ele fez um balanço positivo do movimento dos aeroportos em todo o Brasil no fim do feriado prolongado. Segundo Pereira, só houve um atraso significativo, de uma hora e 10 minutos, em um vôo que partiu de Salvador com destino a São Paulo.

Durante todo o dia de ontem foram 1.740 decolagens no país, com aproximadamente 209 mil passageiros, considerando uma média de 120 pessoas por vôo. O balanço do presidente da Infraero foi feito por volta das 20h, ainda durante o movimento de pico. A estatal continuaria fazendo o acompanhamento dos vôos até o fim da noite, mas o brigadeiro adiantou que a empresa estava preparada para atender uma demanda maior de passageiros do que a que foi registrada ontem.

Congonhas e Galeão

Em Congonhas, o aeroporto mais movimentado do país, a previsão da Infraero era de que 48 mil passageiros passassem pelo terminal. Oito mil a mais do que em dias normais. Até as 17h, apenas seis vôos atrasaram mais de meia hora. A maior espera foi por um vôo da Gol que partiu de Manaus. A previsão de aterrissagem era para as 15h30, mas o avião só chegou às 17h25.

Um balanço do movimento no Aeroporto Internacional do Galeão, na Ilha do Governador, Zona Norte do Rio, divulgado às 18h, indicava que, até o fim da tarde, de 64 decolagens previstas, 11 foram canceladas e 27 atrasaram, em média, meia hora. A Infraero, porém, negou que os cancelamentos estivessem ligados à operação-padrão e informou que o Cindacta 1 aumentou de seis para 10 as posições de monitoramento de vôos. No Aeroporto Santos Dumont, no Centro do Rio, de 25 decolagens marcadas nenhuma foi cancelada. Vinte e dois atrasaram, em média, 12 minutos. 

Hércules Barros, Priscila Borges e Leandro Bisa

Correio Braziliense